PANTANAL NORDESTINO - Sergipe Esconde Relicário da Biodiversidade

22-02-2013 - Nordeste... Quando se escuta esta palavra, duas imagens vêm quase que naturalmente à mente: a terra seca, rachada pelo impiedoso e causticante sol, sob o qual resistem algumas cabras famintas, um pé de palma, uma moita de mandacaru e um casebre de barro. Um sertanejo esquálido de mãos calejadas e pele ressecada pelo sol escaldante. Ou praias paradisíacas, com águas mornas, areias claras e coqueiros. É assim que a imprensa nacional sempre pintou esta região: o verão que traz a seca para o sertão e o clima que atrai os turistas para o litoral. Mas o Nordeste brasileiro esconde muitas outras riquezas e belezas, que eu particularmente sempre apregoei que o interior existe muitas maravilhas ocultas que no litoral. Até mesmo as regiões litorâneas, que todo ano atraem levas de turistas em busca de sol, mar e tranqüilidade, podem reservar surpresas capazes de quebrar a rotina dos tons monocromáticos de azul turquesa / verde esmeralda, que preenchem o céu e o mar.

Em Sergipe, existe um bom exemplo no pequeno município de Pacatuba, há cento e dezesseis  quilômetros da capital, Aracaju. Próximo à foz do Rio São Francisco, uma área de Mata Atlântica, que engloba um conjunto de Dunas e Lagoas Costeiras, esconde um trecho que é considerado um verdadeiro Tesouro da Biodiversidade. Os moradores o chamam de "Pantanal de Pacatuba". Assim como o Pantanal Mato-Grossense, o local é uma planície inundada. Um verdadeiro mosaico de ecossistemas aquáticos interligados, compostos por Lagoas, Rios e Brejos. Seus cenários de beleza abundante abrigam uma rica e diversificada flora e fauna nativa, com abundância de aves, peixes, mamíferos e plantas ornamentais. 

Formação  Com cerca de quarenta quilômetros de extensão, o local foi formado há aproximadamente doze mil anos. Há cerca de vinte e cinco mil anos, o planeta estava no período geológico conhecido como Pleistoceno, e passava por sua última glaciação. O mar ocupava toda aquela região, mas ao longo dos milhares de anos, devido a drásticas mudanças climáticas, foi recuando lentamente. Este recuo é o que provavelmente gerou a topografia da região: uma seqüência de pequenas elevações e planícies que se intercalam. Um bom exemplo para visualizar melhor o que aconteceu: Em uma praia, quando a maré puxa as águas, você já deve ter percebido que no local onde o líquido esteve, formam-se uma seqüência de pequenas ondulações. É praticamente o mesmo processo que aconteceu em Pacatuba, numa escala imensamente maior, é claro. O tipo do solo facilitou o acúmulo das águas, que chegaram através das várias nascentes existentes no local, das chuvas, e das enchentes do Rio São Francisco.

Cientificamente, o Pantanal de Pacatuba é descrito como um Ecossistema Associado à Mata Atlântica. As Lagoas e Várzeas que estão no local, assim como o Manguezal, que também está próximo dali, formam o complexo ecossistema da mata atlântica sergipana. Cada um desses ambientes possui fauna e flora próprias. O Manguezal, em área de água salgada, e as Lagoas de água doce abrigam espécies diferentes. Aliás, eles são considerados como áreas de produtividade primária, ou seja, que funcionam como uma espécie de berçário, uma área de reprodução e alimentação. 

Fauna e Flora – O lugar é mesmo um Relicário da Biodiversidade. Estudos demonstram a existência de diversas espécies nativas, com uma abundância de peixes, mamíferos e aves. Tatus, Tamanduás, Lontras, Capivaras e até répteis ameaçados de extinção, como o Jacaré do Papo-Amarelo (Caiman Latirostris), podem ser encontrados. As características daquele ecossistema são propícias para o abrigo de inúmeras espécies de aves, principalmente as aquáticas, que procuram aquela região graças à grande quantidade de alimento. Elas são um espetáculo à parte. Mais de setenta e oito espécies já foram identificadas pelos ornitólogos, sendo que algumas delas são características do Pantanal Mato-Grossense. Vale destacar o espetáculo da revoada das quatro espécies de Garças encontradas, além dos Sabacus (Nycticorax Nycticorax), Socós (Tigrisoma Lineatum), Mergulhões (Tachybaptus Dominicus) e do Gavião Caramujeiro (Rosthramus Sociabilis).

Cercando o Pantanal, numa região mais alta, algumas formações florestais remanescentes abrigam várias espécies raras de animais, algumas em risco de extinção, como o Macaco-Prego do Peito Amarelo (Cebus Xanthosternos) e o pássaro Papa-Formigas (Herpsilochmus Pectorali). Uma espécie chama a atenção: O macaco Guigó de Sergipe (Callicebus Coimbrai), espécie bandeira do Estado. Seu holótipo (primeiro animal da espécie descrito pela ciência) foi encontrado naquelas matas. Outros animais que ocorrem no Pantanal de Pacatuba (mas que nem sempre podem ser observados)  são a Capivara (Hydrochaeris Hydrochaeris) e a Lontra (Lontra Longicaudis). Boa parte da vegetação pode ficar total ou parcialmente submersa, ou flutuando sobre a água. As espécies vegetais aquáticas desempenham um papel importante como abrigo e alimento para os peixes e outros animais aquáticos. Muitas são utilizadas como plantas ornamentais, devido à beleza de suas flores e folhas. Em alguns casos, o conjunto de plantas formam ilhas flutuantes, chegando a dificultar a navegação dos barcos e canoas.

Das espécies vegetais encontradas no Pantanal de Pacatuba destacam-se as Aningas (Montrichardia Linifera) e a Taboa (Typha Sp.) presentes nas margens dos canais dos rios, e as macrófitas aquáticas, como por exemplo, a Ninfa (Nymphaea Ampla) e os Aguapés (Eichornia Crassipes). 

Ameaças – Mas todo este extraordinário bioma está sob uma ameaça real e próxima: O projeto de transposição das águas do rio São Francisco. O avanço da água do mar, que já está em curso há algum tempo e tende a se agravar, caso se retire ainda mais água do Rio, deve gerar danos irreversíveis. Com a construção de sucessivas barragens, como as de Sobradinho e Xingó, o Rio foi perdendo "força", ou seja, sua vazão foi diminuindo. Houve uma alteração no ciclo natural das águas, que segundo testemunhos históricos, alcançavam até dezesseis  quilômetros mar adentro, estão salinizadas.

Ao longo da região do Baixo São Francisco, já é possível pescar peixes de água salgada, para se ter uma idéia. Outro problema são os projetos de irrigação e as sucessivas obras de drenagem que foram realizadas nas últimas décadas. Eles causaram desastres ambientais, interferiram no fluxo das águas e formaram barreiras que impediram o deslocamento de muitas espécies nativas de peixes de piracema, como o Surubim (Pseudoplatysoma Coruscans) e a Xira (Prochilodus Argentatus) que utilizavam o Pantanal de Pacatuba como área de reprodução e alimentação. O fenômeno das planícies inundada é bastante comum nas proximidades de grandes Rios. Mas por conta da ação do homem, elas são cada vez mais raras.

A região do Pantanal, por exemplo, é a última ainda existente em Sergipe. Daí a importância da divulgação deste paraíso natural: Conscientizar as pessoas e o poder público, do pequeno, mas valioso tesouro que se encontra no igualmente pequeno estado de Sergipe. Vale contemplar, caminhar pela areia da praia, perceber a rica flora composta de plantas aquáticas raras, Bromélias, Mandacarus, Mangabeiras, Cajueiros, Umbuzeiros, Oitizeiros  e outras espécies. 

Infra-Estrutura – A infra-estrutura turística do município ainda é mínima. Há apenas uma pousada em casa de família. No Pantanal, o melhor Restaurante é o do Juarez e na sede do município vale visitar o Restaurante do Zé Antônio.Ou seja, leve o lanche de sua preferência. Sempre vale lembrar de não sujar o meio ambiente. Vale lembrar as sábias palavras do escritor russo Thedor Dostoievsky, que em uma das suas mais famosas citações profetizou: "É a beleza da natureza que salvará o mundo...desde que nós salvemos a beleza...". A pequena Pacatuba, no litoral norte de Sergipe tem uma história de séculos.

Região habitada no passado por índios tupinambás, passou pela invasão de franceses, holandeses e portugueses, mas poucos resquícios deste período podem ser vistos hoje. Apenas a Igreja e a Gruta de pedras centenárias na praça central, construída sobre um cemitério indígena, remetem a este passado. Mas não é pela história nem pela arquitetura, marcada por fachadas simples, sem afastamento da calçada, e pelas casas de taipa na área rural, que Pacatuba tem interesse turístico. A cidade, próxima à foz do Rio São Francisco, fica em um planalto e é cercada por belíssimos Coqueirais, Lagoas, Dunas e Praias desertas. Como o turismo começa a ser explorado só agora e ainda são bem poucos os que vão até lá, a infra-estrutura é mínima e quase não há opções de hospedagem – apenas uma pousada bem básica, a Litoral Norte, e duas pequenas casas de aluguel num sítio –, mas em compensação a natureza está praticamente intacta. Para chegar até lá, pode-se pegar a estrada – bem conservada, por sinal – a partir de Aracaju (cento e dezesseis quilômetros ), ou vindo de Alagoas, atravessar o São Francisco no Ferry-Boat de Penedo a Neópolis e seguir de carro até Pacatuba. Dentro do município, uma estrada de terra – que pelas previsões logo fará parte da Linha Verde – leva até as inúmeras Lagoas e Várzeas do chamado Pantanal de Sergipe. A estrada leva a um ponto mais alto que permite a vista privilegiada de uma paisagem paradisíaca de Coqueirais, Dunas brancas, Lagoas e Mar. No caminho, o visitante cruza com um ou outro carro de boi e passa por singelas construções de taipa e alguns bares (no Bar Mercearia e Restaurante do Juarez pode-se comer um bom pirão com ensopado de camarão). O toque surreal fica por conta das antenas parabólicas, que podem ser vistas mesmo nas casas mais simples, e de pequenos campos de perfuração de petróleo, uma das muitas riquezas da região.

O artesanato também tem papel importante na economia local. Na cooperativa, as artesãs trabalham em bolsas feitas de um tipo de palha encontrado nas lagoas. As peças são vendidas no próprio local e também enviadas para lojas e mercados da região. Apesar de serem comuns nas proximidades de grandes Rios, as regiões de planície inundada são cada vez mais raras por conta da ação do homem. Em Sergipe, o Pantanal de Pacatuba é a última ainda existente. Uma boa pedida para quem está na região é seguir de barco até a foz do Rio São Francisco. Pacatuba fica próxima a Brejo Grande, onde é possível alugar barcos para o passeio – o barqueiro Chico Bento faz o passeio por R$200,00 com barco pequeno e R$ 300,00 com barco grande, mas estes preços são negociáveis dependendo do número de pessoas. O passeio dura de quatro  a cinco horas. As paradas nas prainhas valem um bom banho de Rio ou de Mar – lembrando que nesta região a cor do Mar é escura, justamente por causa do encontro com a água do Rio. Vale a pena procurar a prefeitura de Pacatuba para dicas de passeios. Eles podem passar contatos de pousadas e barqueiros e ajudar na organização de passeios exclusivos.

 

 

 

 

Publicado por Rômulo Cavalcanti Braga  em CRONICAS DO OURO VERDE

Fonte: https://pro.casa.abril.com.br